quarta-feira, 6 de março de 2013

Breve histórico de Rodeio

IMIGRAÇÃO E O COTIDIANO DOS COLONOS EM RODEIO


Com uma população de 10 914 habitantes (Censo 2010), Rodeio preserva muitos aspectos da colonização europeia dos fins do século XIX. Isso se deve ao fato de o Brasil ter sido o destino de muitos imigrantes do Velho Mundo. A Europa enfrentava diversos conflitos de ordem política, cultural, social, o que dificultava a vida de grande parte daquela população. Em contrapartida, no Brasil, depois de 350 anos de exploração da mão-de-obra escrava, iniciaram movimentos para a abolição da escravatura, mas, acima dos interesses humanitários estava o motivo econômico, visto que a escravidão era encarada como atraso.
É a escravidão a causa principal do nosso atraso, nunca houve correntes de imigração para país de escravos, nunca houve indústrias em países de escravos, nunca houve instrução em países de escravos, nunca houve respeito à liberdade alheia em países de escravos na longa experiência da escravidão africana. (Joaquim Nabuco apud. CARUSO; CARUSO. 2007, p. 134 e 135).
O Brasil foi pressionado pela Inglaterra para acabar com o comércio de escravos, o que ocorreu oficialmente em 1850 com a Lei Eusébio de Queirós. Enquanto que a Europa enfrentava um processo de adaptação à industrialização e ao capitalismo, gerando uma crise para as classes artesã e camponesa que desencadeou miséria e mortes. Diante destas situações, motivados pelas notícias sobre a América, italianos, russos, alemães e outros europeus decidiram emigrar para o Novo Mundo. Contudo, “o interesse em torno da imigração não ocorria somente por conta de questões ligadas à ocupação territorial ou à aquisição de mão-de-obra, mas também estava intrinsecamente ligado aos debates raciais do século XIX, cujo foco era o ‘branqueamento’ do país” (FERREIRA; KOEPSEL. 2008, p. 103).

Havia uma forte propaganda que estimulava a vinda de europeus para o Brasil. As propagandas nos jornais e outros meios evidenciavam as maravilhas, as belezas, riquezas, o clima propício e também a ideia de prosperidade garantida em um novo país. A imigração passava a ser um negócio lucrativo para os agenciadores e empresários que prometiam aos imigrantes que “assim que desembarcassem no Brasil, teriam, além da passagem gratuita do porto de desembarque à sede da residência escolhida, terra, sementes, alimentos por mais de seis meses e poderiam tornar-se proprietários assim que tivessem provas de estabelecimento fixo” (op. cit.).

Com a necessidade de mão-de-obra qualificada para substituir os escravos, milhares de italianos e alemães chegaram para trabalhar nas fazendas de café do interior de São Paulo, nas indústrias e na zona rural do sul do país. “No período entre 1875 e 1883, aproximadamente 10 mil italianos foram destinados ao trabalho nos cafezais paulistas” (Pellizzetti apud. FERREIRA; KOEPSEL. 2008, p. 105). Segundo Mariléa e Raimundo Caruso, a partir de 1861 e até meados deste século (XX), a Itália iria exportar vinte milhões de pessoas (2005, p. 130).

AS CAUSAS DA EMIGRAÇÃO TIROLESA-TRENTINA

Em 1875, o nome oficial do Trentino era Tirolo (Tirol) Meridional. O Tirolo pertencia politicamente, mas não linguística e espiritualmente ao Império Austro-Húngaro. Isso porque. em 1875, quando a Itália já estava praticamente unificada, a Província de Trento ainda estava sob domínio do referido Império. Havia movimentos separatistas querendo tornar a região trentina parte da Itália e não da Áustria, mas tais movimentos políticos eram bastante limitados às grandes cidades e às classes burguesas. O governo da Áustria não era ruim, deixava muita autonomia à região. Nas igrejas, nas escolas, nos tribunais e na administração se usava exclusivamente a língua italiana. A classe trabalhadora, em geral, não estava descontente com o governo. Portanto, a razão da emigração quase em forma de êxodo se deve a razões econômicas e não exatamente políticas.

Durante os vinte anos que precederam a data da emigração, o Trentino passou por uma gravíssima crise que abalou profundamente a vida social da região. Os principais setores da economia da época eram a criação do bicho da seda e o cultivo da videira. A indústria da região dependia dessas atividades, mas em 1856 e 1857, a sericultura foi dizimada pela epidemia da pebrina e, antes disso, em 1851, a criptógama da videira alcançou a região trentina. Além disso, o Trentino ficou encravado entre regiões que haviam conquistado a independência e se anexado à Itália, o que ocasionou barreiras alfandegárias e prejudicou todo o sistema econômico, em todos os setores.

Assim, famílias inteiras venderam os seus pertences para pagar a viagem para o Brasil. Os grupos partiram do Trentino (Rovereto, Pèrgine, Fornace, Civezzano, Mattarello, Lèvico Terme e Vìgolo Vattaro) em viagem de trem. Depois seguiam por via marítima em navios até aportar no Rio de Janeiro. Em seguida aportavam em Itajaí para serem conduzidos até Blumenau que era uma colônia que já havia sido fundada há 25 anos pelo Doutor Hermann Bruno Otto Blumenau, um alemão que viabilizou a colonização através de contatos feitos com o Imperador do Brasil.

A VIAGEM E A CHEGADA NA NOVA TERRA

Motivados pelas propagandas e forçados pelas condições que enfrentavam em suas regiões, os italianos e tiroleses começaram a partir para o Brasil. Os preparativos para a viagem duravam em torno de 90 dias. As condições a bordo eram adversas e os registros apresentam inúmeras queixas por parte dos imigrantes, desde a falta de higiene até o aparecimento de doenças ou óbitos durante o percurso.

Ferreira e Koepsel citam em seu livro que após a viagem, os italianos, cujo destino era Santa Catarina, desembarcavam no porto de Desterro ou no de São Francisco do Sul e, em seguida, dirigiam-se ao porto de Itajaí; e aqueles que desejavam estabelecer-se na Colônia Blumenau seguiam viagem em embarcações menores até o destino final (2008, p. 111).

Até o ano de 1875, o movimento imigratório no Vale do Itajaí ocorreu quase que eminentemente por imigrantes de origem e cultura germânicas. Em grande medida, isso ocorreu porque o diretor da Colônia Blumenau, até então, havia privilegiado a imigração alemã. Entretanto, a partir de 1875, começaram a estabelecer-se trentinos, tiroleses e italianos de Vêneto e da Lombardia. “Os trentinos possuíam língua e cultura italianas, entretanto, permeados por traços germânicos, pois eram oriundos do antigo Império Austro-Húngaro” (Dallabrida apud. FERREIRA; KOEPSEL. 2008, p. 112).

Ao chegarem à sede da Colônia Blumenau, os imigrantes eram encaminhados para a “Casa de Recepção”, também conhecida como “Barracão dos Imigrantes”. Karl Kleine (apud. Ferreira e Koepsel) define o barracão como “uma edificação longa e estreita, com muitas repartições [...]. O chão não era assoalhado, nem aplainado. Podia-se contemplar o céu através do telhado [...]. Juntando-se a tudo isso, o estrume de alguns bois que circulavam livremente por ali”. (op. cit.). O tempo de permanência no Barracão variava em torno de 3 a 6 meses, tempo necessário para a compra e preparo do terreno para a fixação e plantio.

No que se refere à alimentação, o emprego de ingredientes de origem brasileira na elaboração de alimentos gerou uma dieta alimentar diferente da europeia. Johann Jakob von Tschudi (apud. Ferreira e Koepsel), registra que a Colônia Blumenau produzia açúcar, cachaça, farinha de mandioca, feijão, fumo, café, araruta, manteiga, queijo, mas isso não significa que esses produtos estivessem à disposição dos colonos para a sua própria alimentação diária. Os mesmos autores ainda citam que além do pão de mandioca, também era comum fazer pão de milho ou de fubá, receitas típicas no Vale do Itajaí, tendo em vista a ausência ou dificuldade para a obtenção da farinha de trigo. Eles acrescentam ainda que eram usadas velas de sebo ou azeite de baleia, ou ainda tronco de araribá para iluminar a noite e que havia um encantamento dos imigrantes com relação à quantidade, sabor e variedade das frutas, especialmente a banana, pouco conhecida na Europa.

Além disso, a região que hoje delimita os municípios de Timbó, Rio dos Cedros, Rodeio, Benedito Novo, e Dr. Pedrinho era local de passagem para os grupos indígenas nômades, Kaingang e Xokleng. Conforme Ferreira e Koepsel,


Em meados do século XIX, quando se inicia um processo mais intenso de colonização na região da Colônia Blumenau, com a fixação de imigrantes que adentraram o interior, o choque entre as duas culturas ocorreu de maneira inevitável e o desconhecimento cultural de ambas as partes motivou diversos conflitos. Dr. Blumenau, ao propagandear sua colônia frente aos debates da colonização, procurou amenizar a questão indígena, afirmando que os índios não costumavam atacar as clareiras abertas onde houvesse “civilização”. Entretanto, essa questão não se confirmou (op. cit.).

Os anos iniciais de instalação dos imigrantes, além de terem sido marcados pelos conflitos e adaptação, se destinaram à subsistência, ou seja, o primeiro passo foi o desmatamento da área para o estabelecimento das primeiras plantações. No período inicial, a lavoura era suficiente apenas para o sustento familiar.

Normalmente, os recém-chegados possuíam pouco dinheiro, e, em alguns casos, trabalhavam 15 dias por mês na abertura e manutenção de estradas. Por meio dessa atividade, podiam obter um soldo de 15 mil réis, que servia para pagar as prestações do lote adquirido, assim como os demais produtos de primeira necessidade que sua colônia (propriedade particular) não poderia lhe oferecer (Vicenzi apud. FERREIRA; KOEPSEL. 2008, p. 114).
Paralelo a este trabalho, os colonos tinham também de providenciar suas moradias. No geral, elas eram montadas com ripas de palmitos, barro e folhas largas. A maioria havia deixado a família no Barracão e, por isso, precisava retornar à sede para buscar seus familiares e iniciar a nova vida.

A COLONIZAÇÃO DE RODEIO E O COTIDIANO DOS IMIGRANTES

O destino de algumas famílias tirolesas-trentinas foi a Picada ou Caminho de Rodeio. Sobre a origem do nome do município, existe a versão geográfica, a histórica, e a versão lendária: a versão geográfica é explicada pela configuração de seus montes em formato de dois semicírculos. Do ponto de vista histórico, segundo consta no livro de comemoração ao Centenário da Imigração de Rodeio, escrito pelos freis Bertoldi e Scottini (1975, p. 11), o nome teria surgido por causa do itinerário que os imigrantes fizeram explorando as margens do Rio Itajaí-Açú a mando do Dr. Blumenau: os colonizadores teriam seguido em direção à nascente até Indaial e lá encontraram uma picada que os fez chegar em Timbó onde já existiam habitantes alemães; continuando pelo amplo vale chegaram onde hoje se situa a cidade, mas resolveram, mesmo contra a ordem dada por Dr. Blumenau, descer o rio, o que os fez voltar a Indaial, exatamente no ponto de partida, perfazendo assim uma volta, ou um "rodeio". Há também uma outra versão considerada um tanto lendária atribuída ao nome de umas pedras redondas e lisas que se encontravam às margens do rio e riachos, denominadas "rodeios" e que teriam dado o nome ao Ribeirão Rodeio, que desemboca no Rio Benedito, perto de Timbó.

Em 1875, vieram 114 famílias (771 pessoas), provindas do Tirol Austríaco, que receberam abrigo no Barracão dos Imigrantes e, posteriormente, foram encaminhadas para a localidade citada, para onde iam a pé a fim de se estabelecerem e darem início à jornada na nova terra.

Conforme Cani, estas famílias vieram distribuídas em 3 turmas: a primeira, composta de 20 famílias, partiu em maio de 1875, aportando aqui no dia 15 de agosto [...]. A segunda turma, composta de 34 famílias, chegou no dia 15 de setembro. A terceira, com 60 famílias, partiu em 28 de agosto e chegou em 28 de outubro (1997, p. 13).

Bertoldi e Scottini relacionam a lista dos pioneiros que colonizaram Rodeio (1975, p. 11 – 12). São eles:
Adami, Domenico
Addami, Casimiro
Addami, Neguni
Anderle, Domnico
Anesi, Giacomo
Baldo, Francesco
Bartlomè, Araldo
Battisti, Batista
Beber, Antonio
Benini, Roberto
Berlofa, Luigi
Berri, Gaspare
Bertoldi, Giacomo
Bombasaro, Alessandro
Benvecchio, Giuseppe
Briddi, Pietro
Campregher, Battista
Carlini, Gioondo
Conzatti, Domenico
Conzatti, Grazioso
Corn, Givanni
Crispim, ...
Cristofolini, Celeste
Cristofolini, Mansueto
Danna, Giovanni
Demattè, Giovanni
Depinè, Carlo
Fadanella, Vva, Orsola
Faes, Giovanni
Feller, Costante
Fiamoncini, Giosuè
Fiamoncini, Giovanni Battista
Fiamoncini, Giuseppe
Fontana, Daniel
Frainer, Alessio
Frainer, Guerino
Franzoi, Bertoldo
Fronza, Antonio
Fronza, Batista
Fronza, Francesco
Fronza, Giovanni Battista
Fruet, Valentino
Furlani, Giacome
Giotti, Carlo
Girardi, Bortolo
Girardi, Domenico
Girardi, Enrico
Girardi, Placido
Gottardi, Felice
Kissner, ...
Longo, Giovanni
Longoni, Luigi
Lorenzi, Giacomo
Lunelli, Antonio
Lunelli, Giovanni
Fachini, Felice
Manfrini, Ermenegildo
Meneghelli, Erminio
Moratelli, Giacomo
Moser, Agostinho
Moser, Antonio
Moser, Antonio (II)
Moser, Augusto
Moser, Giacomo
Moser, Giuseppe
Moser, Luigi Mário
Moser, Pietro
Negherbon, Federico
Negherbon, Luiggi
Noriller, Luiggi
Ochner, Domenico
Pacher, Giovanni
Pacher, Giuseppe
Pandini, Francesco
Pasqualini, Antonio
Pasqualini, Battista
Pasqualini, Domenico
Pegoretti, Antonio
Pezzi, Vva
Pezzini, Marcelo
Pintarelli, Candido
Pintarelli, Emanuele
Pisetta, Battista
Pisetta, Costante
Pinzigher, Domenico
Plotegher, Vicenzo
Raizer, Pietro
Rigo, Antonio
Rigo, Giovanni
Rodela
Roncador, Giacomo
Rosa, Mansueto
Rozza, Battista
Sardagna, Giorgio
Sardagna, Nicolo
Scoz, Domenico
Scoz, Giovanni Battista
Sapagola, Francesco
Spiess, Hermann
Stiz, Giovanni
Stolf, Antonio
Stricher, Luigi
Stulzer, Beniamino
Stulzer, Giorgio
Stulzer, Giuseppe
Tamanini, Nicolla
Tambosi, Antonio
Tambosi, Giuseppe
Tiso, Gabriele
Tomazelli, Francesco
Tomelin, Antonio
Tomelin, Alfonso
Tonelet, ...
Trevisani, Eugenio
Uller, Antonio
Valcanaia, Paulo
Valler, Virgilio
Vimercate, Innocenzo
Vicentini, ...

A situação para os colonizadores em terra estranha não era fácil. Embora o clima invernoso e o relevo tivessem semelhanças com a sua antiga terra, tudo dificultava o seu estabelecimento aqui. Os caminhos abertos com a força braçal eram a única via de comunicação com as cidades circunvizinhas. As viagens geralmente eram feitas a pé, às vezes a cavalo ou de carroças alugadas, em caminho acidentado.

As maiores dificuldades que os colonos enfrentavam, segundo os freis Bertoldi e Scottini, foram: ataques indígenas, animais ferozes, cobras venenosas, matas a desbravar, enfim, tudo estava por se fazer (1975, p. 12). Eles relatam ainda que os imigrantes construíram as primeiras casas de palmitos, trabalhavam de sol a sol, no cultivo do milho, mandioca e uva (op. cit.). No entanto, os colonos logo se adaptaram, mas o trabalho árduo, as mãos calejadas e muita renúncia os marcaram. Eles não se deixaram vencer, embora as quase inexistentes comodidades dessem a eles uma instabilidade principalmente na saúde. Outra dificuldade foi a aquisição de alimentos, as famílias dependiam comercialmente de Timbó, Indaial e Blumenau.

A imigração continuou nos anos seguintes. Os 120 lotes foram divididos entre todas as famílias, todos às margens da Picada de Rodeio. Em 1880, Eugenio Uber foi incumbido de alargar a picada, tornando assim possível o tráfego de carroças, permitindo que elas pudessem transitar até o Rio Itajaí, onde a balsa servia de transporte para o outro lado.

Como a população estava crescendo, muitas famílias se deslocaram para outras regiões mais extensas, atitude necessária para ampliar a área agrícola. Foi então que várias famílias de colonos migraram para o Alto Vale. Entre elas destacou-se o senhor Luiz Bèrtoli, de Rodeio, que chefiou um grupo pioneiro e que povoou as cidades de Rio do Sul, Taió, Rio do Oeste. Em algumas regiões do Médio Vale do Itajaí e do Norte Catarinense, outras famílias dispersaram-se em busca de novas perspectivas de vida e de progresso.

Além da ousadia e do conhecimento agrícola que trouxeram do além-mar, os imigrantes eram muito religiosos, tanto é que uma grande preocupação que tinham era a de construir capelas para praticarem sua religião, o catolicismo, e congregarem. 

A primeira missa foi celebrada nas casas de Giuseppe Fiamoncini e Giovanni Pacher no dia 7 de maio de 1876 por um sacerdote vindo de Blumenau. A construção da primeira capela provisória de "Nossa Senhora das Dores" foi provavelmente realizada em 1876 em terreno doado por Giuseppe Bonvecchio. “Os casamentos eram realizados em Blumenau; os noivos e testemunhas eram transportados em carroças. O primeiro casamento foi o de Antônio Fronza e Lorenza Giácomo” (op. cit.).

Como a capela provisória já se tornava pequena para a comunidade que crescia, os colonizadores trataram de erigir um prédio maior inaugurado em 16 de abril de 1893, que seria a sede dos Padres Franciscanos os quais assumiriam a direção do povo. Na época, ainda se serviam da Capela da "Madona Dolorata", a provisória; enquanto isto já se ativava a campanha para a construção da Igreja Oficial, cuja pedra fundamental foi lançada em 1894, sob a liderança do co-fundador Frei Lucínio Korte, primeiro vigário, em terras doadas por Valentino Fruet e Leonardo Scoz. Em 1894 havia sido fundada a primeira residência dos Padres Franciscanos que servia como escola também. A Igreja Matriz foi oficialmente inaugurada em 4 de junho de 1899 recebendo o nome de "São Francisco de Assis”.

Em 16 de julho de 1905 instalou-se o Convento das Irmãs da Divina Providência para a instrução das crianças e assistência aos doentes. Em 1915 surgiu a Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas, fundada por Frei Policarpo Schuen, com a premente necessidade de atender à crescente atividade da formação e do progresso religioso da infância e da juventude. As três primeiras abnegadas moças que atenderam ao chamado e, portanto, fundaram a Congregação, foram: Amabile Avosani, Maria Avosani e Liduína Venturi, todas três de Rodeio e filhas de imigrantes.

Vicenzi (op. cit.) afirma que “em torno das capelas, os imigrantes, em dias de descanso, reuniam-se para jogar cartas (cinquiglio) e relembrar as velhas canções da pátria, assim como melodias que falavam da nova vida na América”.

Além dos jogos e da música que faziam parte da cultura original, existiam outras formas de entretenimento que mantinham a ligação dos colonos com o Trentino. Bertoldi e Scottini relatam que os franciscanos criaram em Rodeio um jornalzinho em língua italiana, para os colonos desta nacionalidade, com o título L’Amico (o Amigo), que começou a funcionar em 1904 (op. cit.).

Outra preocupação dos primeiros colonos certamente era com a educação dos seus filhos, que deveriam saber, pelo menos, ler e escrever. Mas o problema logo foi solucionado, pois a educação teve fortes ligações com a religiosidade. Isso ocorreu porque nas capelas provisórias desde 1880 funcionavam as escolas também provisórias, que por falta de mestres, os colonos mais instruídos ensinavam as primeiras lições aos filhos dos outros colonos. A base da instrução era fundamentalmente catequese e alfabetização.

O prédio da Escola Paroquial foi construído em 1893 onde também fazia parte o primeiro Salão de Teatro que funcionou juntamente com a escola até 1942. O primeiro Mestre-Escola da Escola Paroquial foi o Irmão Leigo Frei Germano Munsick e a direção era sempre dos Franciscanos. Em 1893 os moradores de São Virgílio e Santo Antônio começaram a erigir suas próprias capelas e escolas. As Irmãs da Divina Providência assumiram a Escola Paroquial Italiana cujas primeiras mestras foram: Irmã Eulógia e Irmã Clemência Beninca. Na capela de São Virgílio os primeiros mestres foram: Vimercati, senhora Ropelato, Savério Bogo e Giuseppe Sevegnani, seguidos depois pelas Irmãs Catequistas. Na Capela de Santo Antônio, os primeiros mestres foram: Giuseppe Zaniuca, Giuseppe Sevegnani e Adolfo Negherbon até a chegada das Irmãs Catequistas.

Informações extraídas do site do município, relatam:

Em 1911 Rodeio teve como meio de comunicação mais rápido e importante a Estrada de Ferro Santa Catarina, a EFSC que realizava uma parada em Diamante. Em 15 de dezembro de 1918 passou a ser criada a Estação Ferroviária de Ascurra que passou a servir a toda a população. Os passageiros de Rodeio eram levados até a Estação de carroça particular ou pelo "Trole" - veículo colocado à disposição dos passageiros e que fazia a função de Correio. Mais tarde foi substituído por um veículo motorizado, uma caminhonete denominada "A Linha". Em 1919 foi inaugurada na Vale Nova a Usina Elétrica, cujo técnico foi Pietro Vota. A Usina forneceu luz e força às moradias até 1930. Em seguida Rodeio passou a receber energia elétrica da Usina Salto de Blumenau, que destinou um Agente para o Posto de Rodeio, o alemão Armando Hoffmann. O posto possuía uma linha de comunicação telefônica com Blumenau. Em seguida instalou-se em Rodeio uma Agência Postal sob a gerência da Senhora Helena Scoz, e em 1924, anexo a esta, começou a funcionar uma Estação Telefônica - Telegráfica. Nesse mesmo ano foi instalada a Coletoria Estadual. [...] Em 1929 foi instalado o Estabelecimento de "Tiro Militar" em Rodeio, extensão do Exército Brasileiro para os jovens ítalo-brasileiros nascidos aqui. Em 1930 foi inaugurado o Hospital "São Roque", empreendimento de espírito comunitário através da Sociedade que o criou. [...] Em 1942 foi fundado o Grupo Escolar "Osvaldo Cruz", primeira Escola Pública Estadual Brasileira em Rodeio, em substituição à Escola Italiana, pois a Colônia encontrava-se em pleno processo de nacionalização da Língua Portuguesa. O primeiro Diretor do "Osvaldo Cruz" foi o senhor Abelardo Souza substituído pela senhora Semíramis Duarte Silva Bosco. No início, o Grupo Escolar recebeu uma equipe de professoras de Florianópolis para suprir a necessidade de formação brasileira. (Conheça a história de Rodeio, 2009).


Aos poucos, os sonhos iam sendo realizados. A América estava sendo moldada conforme as necessidades e as vontades dos colonos. No lugar do mato e da floresta uma pequena cidade se edificava. Ano a ano, as páginas do livro da história de Rodeio eram escritas com muito trabalho e empenho.

PRESERVANDO A IDENTIDADE TRENTINA

Em 14 de março de 1937 o município de Rodeio foi desmembrado do município de Timbó, festejando-se sua instalação oficial. Foi o Dr. Alves Pedrosa, Juiz de Direito da Comarca de Indaial quem deu posse ao primeiro prefeito, o senhor Sílvio Scoz e à primeira Câmara Municipal.

O tempo passou, mas as marcas deixadas pelos primeiros colonos permanecem vivas. Marcas não apenas materiais, mas culturais e sentimentais. Um documentário de 1997, elaborado pela jornalista rodeense Scheila Cristina Frainer Yoshimura, filha de descendentes, conta um pouco da história e de acontecimentos curiosos que ocorreram em Rodeio ao longo de sua História. Scheila diz que


Muitas das fotografias que destacavam as primeiras famílias italianas que vieram até Rodeio mostram um fato curioso: na frente das pessoas que pousavam para a foto, quase sempre tinha ou um vaso de flor ou um cachorro. [...] Era para esconder os pés descalços. Naquela época, poder calçar um sapato era questão de luxo. (Una Storia Italiana, 1997).
Outro fato registrado no documentário e encravado na vida da pequena Rodeio aconteceu durante a Segunda Grande Guerra. Adimir José Tomelin comenta no vídeo que “com a Segunda Guerra Mundial, tanto os alemães como os italianos de Rodeio tiveram que queimar os livros e por causa disso poucos restaram”. Ademir conta ainda que “os que restaram haviam sido escondidos no forro das casas” (op.cit.). A repreensão da época era tanta que foi proibida qualquer manifestação que pudesse lembrar o Fascismo. Conforme comentou a senhora Celestina Fronza, “O ‘Poldo’ Frainer falou italiano, não podia e foi colocado na cadeia”. E não era para menos, Ferreira e Koepsel contam que cidades como Blumenau, Rodeio, Rio do Sul e Timbó, devido à presença de alemães, eram apontadas pelo jornal “O Globo” como localidades onde o Nazismo poderia florescer... (op. cit.).

Mas não são apenas episódios como esses que traçaram a História rodeense. Além do dialeto trentino, da religiosidade, o jogo da “mora” também foi trazido para cá marcando as tradições. Segundo Jaime Depinè relata no vídeo:

O jogo da mora foi inventado na Itália em um presídio pelos prisioneiros. Sendo que eles não tinham outra coisa para fazer, a não ser usar os dedos e a boca para se divertirem. Ali foi que surgiu o jogo da mora. Então foi trazido do norte da Itália para [...] o Vale do Itajaí e estamos cultivando. 
Com tantas demonstrações culturais legítimas, Rodeio ganhou o título de “Vale dos Trentinos”. Iracema Moser Cani, presidente da Federação dos Circolos Trentinos do Brasil, explica no vídeo que desde 1975, ano do Centenário da Imigração Italiana, iniciou-se o intercâmbio com o país europeu e um jornalista [Othmar Seehauser] que veio da Itália para fazer um trabalho a serviço da Editora Manfrini, denominou Rodeio de “Vale dos Trentinos”, um lugar que ele encontrou no mundo, muito parecido com o Trentino de lá. 

Os descendentes procuram manter a herança deixada pelos antepassados. Prova disso é que grande parte do povo ainda fala de maneira primordial e genuína o dialeto trentino, a língua da comunicação familiar, característica marcante que faz desse aspecto linguístico um forte diferencial na preservação dos usos e costumes. Além disso, o Museu de Usos e Costumes da Gente Trentina reúne em sua coleção grande parte do patrimônio perpetuado em suas peças que identificam a vida, o trabalho, a cultura dos colonizadores. O “Circolo Trentino di Rodeio” fundado em 1975, cuja principal missão é a de manter a cultura e preservar as tradições do povo de Rodeio. Em 1977 nasceu em Rodeio o jornal O Corujão, propriedade do senhor professor Geraldino José Ochner. O Corujão até hoje enfatiza os acontecimentos da cidade e destaca o dialeto trentino. A Festa La Sagra, promovida anualmente pelo Circolo, também é um traço marcante que celebra a imigração trentina. A “Rádio Trentina FM” (98.3 MHz), dentre a sua programação comercial e cultural possui o programa “Rádio Itália”, apresentado integralmente em dialeto trentino todos os domingos de manhã. Além de tudo isso, encontra-se um monumento que homenageia as primeiras famílias que se instalaram em Rodeio. Na “Praça dos Imigrantes”, em frente a Prefeitura Municipal, estão inseridos os nomes dos primeiros corajosos (citados anteriormente) que ousaram deixar sua terra para construírem uma nova pátria. E não se pode deixar de mencionar o Gruppo Folk Trentino di Rodeio, que através da dança folclórica divulga e mantém a tradição trentina-italiana dentro e fora do município.

Diante dessa breve narração histórica sobre a formação de Rodeio, constata-se que a necessidade, a coragem, a força, a fé e a determinação foram alguns dos elementos constituintes da saga dos imigrantes que colonizaram e fundaram a cidade de Rodeio, no Vale do Itajaí. O resultado não foi apenas um local reconhecido no mapa. É mais do que isso, afinal, muito se construiu em Rodeio: casas, ruas, capelas, escolas, igrejas, hospital, mas principalmente, uma magnífica história impregnada de momentos de dificuldades e alegrias que jamais serão apagados do passado e da memória de cada descendente. Rodeio é o sonho realizado de muitos imigrantes que saíram da sua velha terra para edificarem fora da Europa um novo lar, uma nova vida, uma nova história.

REFERÊNCIAS

BERTOLDI, Frei José. SCOTTINI, Frei Guido. Rodeio 1875 – 1975 Aspectos de sua História e de sua gente. Gráfica 43 AS Indústria e comércio – Blumenau: Rodeio. 1ª ed. 1975.

CANI, Iracema Moser. Rodeio Vale dos Trentinos, Compendio. 1.ed. Rodeio: Prefeitura Municipal de Rodeio, 1997.

CARUSO, Mariléa Martins Leal; CARUSO, Raimundo C. Imigrantes 1748 – 1900 Viagens que Descobriram Santa Catarina. Unisul: Tubarãol. 2007.

CONHEÇA A HISTÓRIA DE RODEIO. Disponível em: < http://www.rodeio.sc.gov.br/conteudo/?item=11378&fa=8365&PHPSESSID=hdfc3afqmvv07g8t0ltpm842l6>. Acesso em: 07 nov. 2009.

FERREIRA, Cristina; KOEPSEL, Daniel Fabricio. Representações da Cidade: discussões sobre a história de Timbó. Blumenau: Edifurb. 2008.

UNA STORIA ITALIANA. Direção de Scheila Cristina Frainer Yoshimura. Vale do Itajaí: Univali, 1997. 1 DVD (22 min): son. DVD.

Pesquisa adaptada por Josimar Tais - Professor de História.

Conheça a história do Gruppo Folk Trentino di Rodeio

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